A Bíblia, nos
capítulos dezoito e dezenove do Primeiro Livro dos Reis, nos apresenta uma
extraordinária experiência de Deus, tendo como protagonista o profeta Elias. O
fato ali narrado ocorreu cerca de nove séculos antes da era cristã.
Elias não se
conformava com o comportamento do povo escolhido, que havia abandonado o culto
ao Deus verdadeiro para seguir as ideias dos profetas dos povos vizinhos,
adoradores do deus Baal. Tendo percebido que, sem algum gesto dramático, não conseguiria
levar seu próprio povo à conversão, propôs um desafio aos profetas de Baal:
eles escolheriam um novilho, o preparariam para o sacrifício e o colocariam
sobre a lenha, mas sem pôr fogo. Ele, por sua vez, faria o mesmo. Em seguida,
cada um invocaria o nome de sua divindade: ela é que deveria acender o fogo,
para que a oferta fosse queimada. Conforme a resposta obtida, saberiam do lado
de quem estava o Deus verdadeiro.
Aceito o
desafio, os seguidores de Baal dispuseram tudo de acordo com o que fora combinado
e iniciaram as súplicas. Multiplicaram as orações e nada conseguiram. Vendo-os
e escutando-os, Elias fez um comentário irônico: “Gritai mais alto, pois sendo
deus, Baal pode estar ocupado. Quem sabe ausentou-se ou está de viagem; ou
talvez esteja dormindo e seja preciso acordá-lo”. Os profetas de Baal passaram
das súplicas aos gritos; em seguida, se autoferiram até o sangue escorrer. Nada
conseguiram.
Ao chegar sua
vez, Elias mandou que derramassem água tanto sobre a lenha como sobre a
oferenda que preparara. Pediu, então, que Deus se manifestasse: “Ouve-me,
Senhor, ouve-me, para que este povo reconheça que tu, Senhor, és Deus, e que és
tu que convertes os seus corações”. A resposta foi imediata: veio fogo sobre o
altar, consumindo a oferta, a lenha e as próprias pedras do altar. Tirando
proveito de seu sucesso e querendo exterminar o mal pela raiz, Elias mandou que
fossem degolados todos os profetas de Baal. Depois disso, foi ameaçado de morte
e perseguido. Para piorar a situação, teve o desgosto de ver que, mesmo depois
disso tudo, seu povo não se converteu ao Deus verdadeiro. Desanimado e com
vontade de morrer, foi socorrido por um anjo e partiu em direção ao Monte
Horeb. Ali fez a experiência de Deus a que me referi no início.
Sabendo que o
Senhor passaria em seu caminho, o profeta o esperou, de pé. Viu então,
sucessivamente, o desenrolar de vários fenômenos grandiosos. Ficou atento, pois
Deus poderia se manifestar através deles. Mas Deus não estava nem no furacão
violento, nem no terremoto, nem no fogo. Finalmente, ouviu-se o murmúrio de uma
brisa suave. O Senhor estava nela.
Também hoje,
em nossa vida, Deus se manifesta muitas vezes e de maneiras diferentes. Por
vezes serve-se de acontecimentos extraordinários, como são os desequilíbrios da
natureza, as grandes decepções, uma doença grave ou a morte de uma pessoa que
nos é querida. Normalmente, porém, manifesta-se em nossa vida por meio de
brisas suaves – isto é, de acontecimentos tão simples que não valorizamos; tão
rotineiros que nem percebemos; tão frequentes que nem lhes damos valor.
Contudo, cada passagem sua é especial, irrepetível e única.
O episódio
envolvendo Elias nos ensina que é o Senhor que escolhe a maneira de se
manifestar a nós. Mesmo assim, muitos preferem ir atrás de experiências exóticas
ou envolvidas pelo misticismo superficial, já que elas não exigem qualquer
mudança de vida. São preferidas as experiências que mais agradam aos sentidos e
as que acalmam a consciência com pensamentos vagos e que, por isso mesmo, não
geram nenhum compromisso ou responsabilidade. Sem perceber, imitam-se, hoje, os
antigos pagãos, que costumavam criar deuses à sua própria imagem e semelhança –
isto é, com as limitações e os defeitos humanos.
Enquanto isso,
o Deus vivo e verdadeiro passa em nossos caminhos como uma brisa suave e amena,
para possibilitar-nos experiências marcadas pelo amor, pela alegria e pela paz.
Só O perceberemos se formos capazes de valorizar o sorriso de uma criança, a
beleza de uma flor à beira do caminho ou a onda do mar que se desmancha na
areia da praia.
Dom Murilo
S.R. Krieger
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