Jesus fala como o povo. Usa figuras extraídas do
dia-a-dia, como lírios e pardais, redes e lamparinas, agulhas e camelos. Mescla
todos os “mundos”: o feminino (com a massa de pão e os remendos da roupa velha)
e o masculino (os denários e os banquetes); o urbano (dos mendigos) e o rural
(dos semeadores); o adulto (com os tribunais) e o infantil (com os folguedos na
praça).
No Evangelho de hoje, Jesus fala de um fio de
cabelo. Nada menor, mais insignificante! Aliás, mera excreção do organismo. Em
outras passagens, Jesus fala das mãos (que vale a pena amputar, antes que
perder o Reino!), dos olhos (atrapalhados por traves), dos ouvidos (que não
querem ouvir), dos rins (que devem estar sempre cingidos, na prontidão para o
caminho).
Hoje, quase microscopicamente, o Mestre chama a
atenção para um simples “fio de cabelo”. Sua intenção é dizer que, mesmo em
meio a perseguições orquestradas pelos sequazes do anticristo, entre maçonarias
e cárceres, tiranos e régulos, podemos estar confiantes na divina proteção,
pois “nem um fio de cabelo se perderá de vossa cabeça”;
Sem esta confiança, Paulo não enfrentaria a
oposição dos compatriotas, Francisco Xavier não atravessaria mares e oceanos
naquelas casquinhas de noz que chamavam de “navios”. Sem a certeza de que o
Senhor está de nosso lado, Maximiliano Kolbe não se ofereceria para morrer em
lugar do outro condenado. Sem a convicção de que Deus caminha conosco, Madre
Teresa não teria trocado a segurança de seu convento pelas agruras da vida no
sórdido lixão de Calcutá...
É bem verdade que andamos iludidos por longo tempo.
De algum modo, chegamos a acreditar que a adesão ao Evangelho nos granjearia
fama e poder, aplausos e benesses. Como servos de Deus, ocuparíamos lugar nos
palanques do mundo, entre as autoridades civis, militares e... eclesiásticas.
Esse tempo passou. Ainda bem. Hoje, a mídia zomba
da Igreja, crucifica os ministros de Jesus no calvário das manchetes. Prega um
anti-Evangelho feito de ódio e sarcasmo. A propaganda induz ao pecado. Os
parlamentos legitimam o aborto, chancelam a eliminação dos velhinhos. Daqui em
diante, ninguém pedirá o batismo para lucrar. Ninguém abraçará o Cristo para se
mascarar...
Daqui em diante, todos sabemos que ser cristão é
navegar contra a corrente, viajar na contramão. E, apesar disso, nem um fio de
cabelo cairá de nossa cabeça – garante Jesus!
Orai sem cessar: “Aclamemos o rochedo que nos
salva!” (Sl 95 [94], 1)
Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova
Aliança.