terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Confiar sempre



Ela o segurava nos braços, debaixo de um sol forte e em meio à agitação própria da cidade grande; ele dormia sereno e calmo, pois estava seguro de que nada poderia atingi-lo. Essa cena não faz parte de um filme, é real e, apesar de tê-la contemplado há algum tempo, ainda hoje me recordo claramente dela. No ponto de ônibus, uma mãe, com ar de preocupada, segurava seu filho nos braços enquanto mantinha os olhos fixos nos ônibus que chegavam e saíam sem parar. Um deles poderia ser o seu e ela não poderia nem sequer pensar em perdê-lo. Observei que, apesar da agitação própria do local e da preocupação aparente da mãe, a criança dormia tranquila e sossegada. Sem palavras parecia dizer: "Nada temo, pois os braços que me seguram são de alguém que me ama".

Naquele dia, a cena foi um pretexto para Deus falar comigo. Já observou que quando não paramos para ouvir a voz de Deus, por meio da oração, Ele nos fala pelos fatos? No meu caso, eu estava vivendo um tempo de muita correria no trabalho, já não conseguia rezar como antes e queria resolver todas as coisas com minhas forças. Quando ocupamos o lugar de Deus é isso que acontece. Com aquela situação, o Senhor foi me mostrando que eu precisava confiar mais no amor d'Ele. Precisava viver a atitude daquela criança, ou seja, abandonar-me. Na verdade, precisava amá-Lo mais e deixar-me amar por Ele, pois só confia quem verdadeiramente ama, e quem ama consequentemente confia.

E mais: Deus Pai abriu meus olhos para eu perceber que a raiz da minha agitação era também falta de amor-próprio e má interpretação do Seu amor por mim. Eu estava me comportando como serva de Deus e não como Sua filha. E isso faz uma grande diferença em nossa vida como cristãos. O próprio Senhor disse em Sua Palavra: “Já não vos chamo servos, mas amigos [...]” (João 15,15), ou seja, o Senhor nos elegeu, amou-nos, não quer apenas o nosso serviço, mas nosso amor. Isso é próprio de uma relação de amizade. Amamos e somos amados, e o amor vai além do fazer.

Hoje, por providência, contemplei uma cena semelhante e lembrei-me das lições de outrora. Já não estou tão agitada como antes, vivo uma fase diferente. Mas uma coisa é certa: preciso continuar na escola da confiança. Devo aprender mais de Deus na matéria do amor. "O amor lança fora todo temor, é paciente, tudo suporta, tudo crê, tudo espera [...]" (I Coríntios 13,4-7). É por isso que quem ama confia!

Quanto mais amamos Deus e nos deixamos envolver por Sua misericórdia, tanto mais vamos encontrando a harmonia que tanto desejamos e a qual, muitas vezes, buscamos nas pessoas, nos cargos, no poder, no ter ou de tantas outras formas aparentes de segurança neste mundo.

O abandono é, antes de tudo, uma atitude de confiança, fruto da maturidade, e a maturidade não se alcança de uma hora para outra, é preciso ter paciência com o tempo, dar passos e superar os obstáculos. É por isso que quem já teve sua fé provada, tem mais facilidade em confiar em Deus, tem forças para ir mais longe mesmo quando tudo parece perdido.

Aquela criança provavelmente se sentia amada, por essa razão as circunstâncias não a impediam de confiar e repousar tranquilamente no regaço acolhedor de sua mãe.

São Francisco de Sales faz uma interessante comparação quando fala da alma recolhida em Deus. De fato, diz ele; "[...] os amantes humanos contentam-se, às vezes, em estar junto da pessoa a quem amam, sem lhe falarem nada e sem nem sequer pensar em outra coisa que não seja estar ali... Sentem-se amados e isso basta. É assim que acontece com a alma que se entrega aos cuidados do Criador. Repousa sossegada, mesmo em meio aos constantes desassossegos que vive no dia a dia".

Compreendo, cada vez mais, que a experiência do abandono em Deus passa pela descoberta do Seu amor incondicional por nós.

Peço ao Senhor que hoje lhe permita viver esta experiência e o cure profundamente de toda falta de amor, devolvendo-lhe a serenidade e a paz, fruto da confiança n'Ele.

Assim como a mãe segura em seus braços o filho amado, Deus, hoje, o segura, por isso não tema. Nos braços do Pai nada poderá atingi-lo. Quem ama confia.

Dijanira Silva, missionária da Comunidade Canção Nova

Leitura Bíblica: Mateus 6, 7-15



A oração do Pai-Nosso é atribuída ao próprio Jesus. O evangelista Lucas  conta como os discípulos, tendo visto Jesus em oração, aproximaram-se dele e disseram:  “Senhor, ensina-nos a rezar”.  Lucas insiste em nossa incapacidade de rezar e  com isso apela para autoridade de Jesus. O Pai-Nosso se torna a oração de Jesus na qual nós também devemos “entrar”.  Mateus, por sua vez, coloca o acento  nas condições de uma verdadeira oração : entrar no secreto do coração e não multiplicar os pedidos como se Deus pudesse ser “dobrado” à força de muitas palavras. O Pai do céu sabe o que precisamos antes mesmo que tenhamos expressado nossos pedidos. O primeiro evangelista faz preceder a oração do Senhor com esta observação.

Quando Jesus  nos convida a dizer o Pai-Nosso, ele nos trata de igual a igual. Com estas duas pequenas palavras tudo se passa como se bruscamente  nos tornássemos irmãos de Jesus, como se entrássemos no relacionamento íntimo que ele estabelece com o Pai. Por isso, é importante ater-se sobre estas duas palavras. Elas constituem, ao mesmo tempo, a porta de entrada e o ponto de chegada da oração de Jesus. Alguns que não tiveram boas experiências do pai da terra têm dificuldade em rezar  o Pai nosso. Na realidade, a paternidade humana encontra sua fonte e sua vitalidade na paternidade de Deus. Deus é o único e verdadeiro pai. Os pais da terra o máximo que conseguem é assemelhar-se a ele.

O Pai-Nosso não começa com pedidos para nossa vantagem ou para cobrir nossas carências. Pedimos que o nome de Deus seja santificado, quer dizer, Deus, o Pai de Jesus, seja reconhecido por todos por aquilo que ele  é. Pedimos que venha seu reino, quer dizer o Reino de Deus e que ele possa difundir-se em todo o mundo. Que se realizem entre os homens relacionamentos de amor que existem entre Jesus e o seu Pai. Pedimos que sua vontade seja feita na terra como ela é feita no céu.  Esse Deus precisa de nós.  Seu reino só pode realizar-se se  fazemos nossa a sua vontade.

Seguem os pedidos que nos concernem: o pão de todos os dias, o perdão e o distanciamento nosso da tentação,  a libertação do mal. O pão é o alimento do corpo e também o alimento  da totalidade da pessoa, ou seja, a eucaristia.  Quando  pedimos perdão, comprometemo-nos a  perdoar e também que a tentação não seja insuportável.  E que sejamos libertos do mal.

Frei Almir Ribeiro Guimarães