No dia 1º de
julho, o corpo do menino Brayan Capcha, de 5 anos, foi levado para a Bolívia,
onde havia nascido. Ele tinha sido assassinado com um tiro na cabeça alguns
dias antes, em São Paulo, depois de entregar ao criminoso os últimos centavos
que carregava consigo. Entre lágrimas, pediu-lhe que não matasse a mãe e o
deixasse viver. Mas o assaltante não tolerou o seu choro e lhe desferiu um tiro
na cabeça.
No mesmo dia,
o Parlamento da Bélgica começou a debater a aplicação da eutanásia para os
menores de idade. Para os adultos, ela está em vigor desde o ano de 2002, e
lhes permite pôr fim à vida com uma injeção letal em casos de doenças
terminais. A partir de então, 1.432 pessoas recorreram à medida. A nova
proposta de lei autoriza os médicos a atender ao pedido de crianças e
adolescentes que solicitam a eutanásia «por se encontrarem em situações médicas
sem saída, em estado de sofrimento físico, psíquico constante e insuportável».
Em julho
também vieram à tona as declarações do Ministro da Economia do Japão, Taro
Asso, sugerindo que, por motivos econômicos e para o bem da nação, «os idosos
se apressem a morrer. Se eu estivesse na situação dessas pessoas de idade
avançada que recebem acompanhamento médico, sentir-me-ia mal, sabendo que o
tratamento é pago pelo Estado».
Estes e mil
outros fatos do mesmo teor que sucedem diariamente no mundo refletem a
mentalidade pagã que tomou conta de amplos setores da sociedade atual, a
começar de algumas lideranças políticas. Concretiza-se, assim, a “profecia”
feita pelo escritor russo Fiodor Dostoievski, há 150 anos: «Tirem Deus da
sociedade e salve-se quem puder!». Com ele concorda o Papa Francisco, num
pronunciamento que fez no Rio de Janeiro, no dia 27 de julho: «Em muitos
ambientes, ganhou espaço a cultura da exclusão e do descartável. Não há mais
lugar para o idoso e para o filho indesejado. Não há mais tempo para se deter
com o pobre caído à margem da estrada. As relações humanas parecem regidas por
apenas dois dogmas: a eficiência e o pragmatismo».
Escrevi acima
que, em alguns países, essa mentalidade pagã está sendo propugnada por
autoridades políticas. Mas, para ser exato, preciso incluir na lista também os
meios de comunicação social. Um exemplo concreto foi dado pela Rede Globo no
dia 23 de agosto, através da novela “Amor à vida”. Em dado momento, um ator no papel
de médico, afirmou que «o aborto ilegal está entre as maiores causas de mortes
de mulheres no Brasil, um caso de saúde pública».
Graças a Deus,
de uns anos para cá, muitos leigos cristãos passaram a ocupar o seu lugar, não
apenas na Igreja, mediante serviços litúrgicos e catequéticos, mas também na
sociedade. Foi o que se viu na “nota” que dirigentes do “Movimento Nacional da
Cidadania pela Vida (Brasil sem Aborto)” difundiram no dia 23 de agosto,
contestando a Globo e pondo os pontos nos is: «Os dados oficiais, disponíveis
no Datasus, atestam que, no Brasil, em 2011 (último ano a ter os dados
totalmente disponíveis), faleceram 504.415 mulheres. O número máximo de mortes
maternas por aborto provocado, incluindo os casos não especificados,
corresponde a 69, sendo uma delas o aborto dito legal. Portanto, apenas 0,013%
das mortes de mulheres se devem a aborto ilegal. 31,7% das mulheres morreram de
doenças do aparelho circulatório e 17,03% de tumores. Estes, sim, constituem
problemas de saúde pública.
A Globo fez
também clara confusão entre os conceitos de “omissão de socorro” e “objeção de
consciência”, com laivos de intolerância à liberdade religiosa. Desconhecemos
que alguma religião impeça seus membros de prestar socorro a “pecadores”. Se
assim fosse, inúmeros assaltantes e assassinos que chegam baleados aos
hospitais, ficariam sem atendimento. Se até um bandido assassino, que foi
ferido no embate, tem direito a atendimento médico, como caberia negá-lo em
situações de sequelas do aborto? Se a Rede Globo deseja problematizar o debate,
que o faça a partir de dados e situações verazes, e não se contente em
reproduzir jargões propagandísticos!».
Tudo isso para
não voltar aos tempos e aos métodos de Voltaire: «Menti, menti, que alguma
coisa ficará!».
Dom Redovino Rizzardo, Bispo de Dourados
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